Dogchild - Análise

Dogchild propõe-se a chamar a atenção do público juvenil para uma causa nobre. Contudo, a execução falha em praticamente todos os quadrantes.

Depois de ter terminado Dogchild, a sensação predominante é de ter dedicado o meu tempo a uma apresentação para consumo interno, ou seja, algo que ainda não é bem a versão 1.0, a versão que todos os jogadores interessados podem comprar e descarregar na PlayStation Store. Desenvolvido pela Animatoon Studio, estamos perante o vencedor da primeira edição dos Prémios PlayStation em Espanha; estamos perante uma desilusão em praticamente todos os quadrantes.

Dogchild - Análise
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A causa é nobre e há que reconhecer a sua transposição para um videojogo: o jovem Tarpak e o seu cão Tarao estão na linha da frente no combate a uma organização maléfica que tem como motivação maltratar os animais. Com Dogchild a ser destinado a um público juvenil, é importante que saibam que isto existe e, sobretudo, que retirem algo lúdico da experiência, nem que seja tratar bem os animais e opor-se como poderem a quem não o faz.

O jogo começa num parque e leva-nos por vários cenários enquanto vamos fazendo frente à organização Cornish, que misteriosamente está associada ao desaparecimento de cães e a experiências nos mesmos. Ainda que tenha uma longevidade curta, a aventura leva-nos de passagem a vários cenários, incluindo um trecho na neve perto do seu final. Ainda que se possa pensar que a variedade é um dos seus pontos menos fracos, a verdade é que a diversidade nunca chega a ter argumentos para instigar a sensação de diferenciação entre eles.

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Aliás, mesmo a narrativa tem na mensagem a passar o seu ponto mais recomendável, uma vez que tudo o resto é desenxabido, sensaborão, com vários clichés. As linhas de diálogo são básicas, a vocalização inexistente e a localização para português paupérrima. Penso que estarão associados à tradução de espanhola para o nosso idioma, mas é um facto que reparei em pelo menos dois erros gritantes: “pregunta” e “debe”, com este último exemplo a estar inserido na frase “O dono de Cornish debe estar perto”. Estas faltas de atenção acabam por sabotar o aspecto lúdico descrito nos parágrafos anteriores.

E nada disto melhor na jogabilidade. Como já mencionei, o protagonismo da aventura é dividido por Tarpak e Tarao, sendo possível ao jogador ir alternando entre os dois consoante as exigências dos processos de jogo. Tarao, o cão, tem no seu olfato o ponto mais distintivo, ou seja, é possível farejar pistas e trilhos enquanto lhe vestimos a pele. Tarpak consegue atirar bolas às ameaças que forem surgindo no seu caminho.

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É possível ver uma linha com uma trajetória de cada arremesso, algo que ajuda na pontaria feita a drones ou inimigos de carne e osso. Convém mencionar que estes últimos ficam atordoados durante um período de tempo variável que é a nossa janela temporal para os amarrarmos e evitarmos novos ataques dos seus tasers. Tudo isto cai rapidamente numa rotina desinteressante que é traduzível num fardo para o jogador.

Tudo parece ultrapassado, não há ideias novas, e as antigas que são colocadas em prática pela produtora nem sempre têm a melhor implementação. Ocasionalmente, estes guardas parecem ter uma pontaria olímpica, capaz de despoletar uma, duas, cinquenta vezes uma animação de Tarpak a apanhar um choque que tem tanto de básico que não pode ser levada a sério.

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Quando não estiverem ocupados a jogar ao gato e ao rato com guardas que parecem ser todos fruto de um único molde, têm objetivos que não cativam: soltar cães espalhados pelo cenário, recolher partes de um trenó, lutar contra bosses com que já lutámos noutras dezenas ou centenas de jogos, escapar a um gás venenoso, decifrar códigos que nem para uma criança com cinco anos são desafiantes.

Se neste momento estão a pensar que as secções com plataformas vão salvar os estragos causados pelos trechos de combate e investigação, estão a seguir uma linha de pensamento errada. Seja porque não fazem sentido graças a planos de câmara fracos, seja porque a produtora achou por bem dotar o cenário na neve com plataformas pequenas e com uma superfície que parece ter sido barrada com manteiga, o que sem grande surpresa resulta em vários recomeços, é gritante a falta de polimento e de refinamento.

E este refinamento da jogabilidade está presente na forma como as duas personagens se deslocam pelo cenário. Mesmo quando não estamos a sofrer com a ambiguidade do caminho a seguir, tanto Tarpak como Tarao tem uma locomoção romba, o que obviamente é uma acendalha para a nossa frustração crescente. A maioria destes erros e deslizes podia facilmente ser ajustada com mais algum tempo dedicado à produção.

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Ocasionalmente, Dogchild permite vislumbres do que poderia ter sido. O bom senso diz facilmente que o seu propósito nunca seria rivalizar com videojogos que chegam ao mercado depois de anos em desenvolvimento e de um investimento de milhões, nem era isso que eu esperava, contudo, mesmo tendo em consideração o público-alvo e a atração lúdica que poderia ter sido, é uma obra que fica aquém do princípio ao fim.

Aliás, por falar em final, fica a sensação que algo foi cortado da versão final. Obviamente só a produtora poderá responder com clareza a isso, mas o salto narrativo que é dado sugere que talvez o plano inicial não coincida com a obra que podem comprar para a PlayStation 4. Independentemente disso, a reta final é apresentada de forma desequilibrada e trapalhona, não recompensando minimamente o tempo investido.

E convém mencionar que Dogchild faz parte do catálogo PlayStation 4, pois a olhar para o grafismo isso poderá não ser claro. Por outras palavras, desde a texturas dos cenários à modelagem das personagens, passando pelos poucos efeitos usados, a fidelidade gráfica é paupérrima, parecendo na maioria das vezes que estamos a participar numa aventura publicada na PlayStation 3.

Dogchild - Análise

Na sonoplastia o desencanto é o mesmo. Seja o reparo em vários silêncios constrangedores, seja o loop exagerado dos mesmos trechos de dez segundos ad nauseam, não há aqui nada de recomendável nem memorável. Tirando a irritação que provoca no momento, é mais um capítulo que será esquecido minutos depois de verem os créditos finais rolarem no ecrã.

No fundo, é admirável a ambição da Animatoon Studio. Certamente teria sido mais fácil levar a concurso uma obra mais descomplicada. Se ganharia ou não os Prémios PlayStation é algo que ficará por responder, mas comprometeram-se a criar uma aventura que apoia uma causa nobre e, que se tivesse sido bem executada, seria uma sólida obra de estreia. Infelizmente, parecem ter apontado para demasiado perto do sol e tiveram um desfecho parecido com Ícaro.


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Dogchild - Análise Dogchild - Análise Reviewed by Unknown on 10:25:00 Rating: 5

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